O governo Lula (PT) precisará empenhar quase R$ 1 bilhão em emendas por dia, em média, para conseguir executar toda a verba carimbada pelos parlamentares para seus redutos eleitorais até o final de 2024.
O ceticismo de que esse esforço seja viável é um dos fatores que alimentam a indisposição dos congressistas com as pautas de interesse do Executivo, incluindo o pacote de contenção de gastos apresentado pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda).
Segundo dados do Painel do Orçamento, havia até segunda-feira (9) R$ 13,3 bilhões em emendas parlamentares ainda não empenhadas, quase 26% do total de R$ 51,9 bilhões destinados a essas verbas.
O empenho é a primeira fase do gasto, quando o governo faz a reserva dos recursos para futuro pagamento. Considerando os 14 dias úteis até o fim do ano, seria necessário empenhar uma média de R$ 951 milhões por dia para exaurir os recursos à disposição dos congressistas.
Descontado o R$ 1,3 bilhão que está bloqueado para compensar o aumento de outras despesas obrigatórias, essa média cairia a R$ 858 milhões —um valor ainda significativo. O congelamento pode ser revertido até o fim do ano, caso a equipe econômica verifique um crescimento menor dos demais gastos.
As emendas são uma forma pela qual deputados e senadores conseguem enviar dinheiro para obras e projetos em suas bases eleitorais e, com isso, ampliar seu capital político. A prioridade do Congresso tem sido atender seus redutos eleitorais, e não as localidades de maior demanda no país.
Efetivar o empenho ainda em 2024 é crucial para os parlamentares, pois despesa empenhada e não paga pode ser quitada nos exercícios seguintes, por meio dos chamados "restos a pagar". Por outro lado, se o ano vira sem que o empenho tenha sido realizado, o espaço é perdido, já que um novo Orçamento tem início.
Com o presidente na UTI após uma hemorragia intracraniana, quatro ministros foram escalados para destravar as emendas e o pacote de contenção de gastos: Haddad, Alexandre Padilha (Relações Institucionais), Rui Costa (Casa Civil) e Jorge Messias (AGU).
Nesta terça-feira (10), o governo editou uma portaria para retomar o pagamento das emendas parlamentares, após cinco meses de crise entre os Poderes e ameaças do Congresso de emperrar o pacote de corte de gastos do Executivo.
As novas regras foram publicadas sob a justificativa de adequar o processo à recente decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre o tema, mas o texto pode abrir brechas para dribles de congressistas à transparência das emendas.
No Congresso, parlamentares veem com desconfiança a promessa do governo de liberar emendas até o fim do ano. Mesmo com a portaria para facilitar o repasse do dinheiro, a avaliação predominante é de que não há mais tempo hábil para executar o que já foi indicado.
Nas emendas impositivas individuais, o governo já empenhou R$ 21,6 bilhões, mas ainda falta executar R$ 3,45 bilhões. Já nas emendas impositivas de bancada, foram destinados R$ 6,25 bilhões, e restam outros R$ 2,3 bilhões.
Nas emendas de comissão, os empenhos somam R$ 10,1 bilhões. Falta executar R$ 5,4 bilhões orçados, dos quais R$ 1,3 bilhão está bloqueado devido ao aumento de outras despesas obrigatórias.
Há ainda R$ 2,7 bilhões em emendas de bancada inseridas dentro das despesas discricionárias do Poder Executivo. Desse valor, só R$ 586,7 milhões foram executados, restando R$ 2,1 bilhões pendentes.
O líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), afirmou nesta terça que o governo fará "o possível e o impossível" para honrar todos os pagamentos até o fim do ano.
"A norma executória [da Advocacia-Geral da União] para dar força à portaria explicita e dá a tranquilidade necessária da execução dos termos da decisão de ontem [segunda-feira, 9] do ministro Flávio Dino", disse. "Este é o desafio que temos, garantir a execução [das emendas] até 31 de dezembro. Nós vamos trabalhar para isso."
O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, também disse, na terça, acreditar que medidas do governo para destravar o pagamento de emendas parlamentares devem contribuir para reduzir a tensão no ambiente político no Congresso Nacional.
"Ontem [segunda-feira, 9] a equipe jurídica do governo passou analisando a decisão do Supremo e comunicando, tanto aos deputados e senadores quanto às áreas operacionais do governo, para dizer qual era a interpretação possível", disse Durigan.
"O timing está apertado. A decisão foi de ontem, ontem mesmo a gente teve uma série de conversas para esclarecer, então vai ter um parecer da AGU cumprindo essa força executória, indicando para as áreas operacionais o que pode ser feito. E, ao mesmo tempo, outros atos normativos e infralegais que vão operacionalizar o acordo que foi travado", afirmou.
Na avaliação do secretário, as medidas serão suficientes para aplacar a tensão com o Congresso. "Eu acho que tem um esforço de votação agora no fim do ano", disse.
Fonte: Folha de São Paulo
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